Foto: Divulgação / MPSC

TJSC acompanhou entendimento do Ministério Público, que sustentou que as decisões judiciais que determinaram a retirada dos invasores da área de preservação permanente já transitaram em julgado e não são passíveis de revisão.

Como defendido pelo Ministério Público de Santa Catarina (MPSC), foi derrubada pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) a medida que impedia a retirada de imóveis construídos ilegalmente em área de preservação permanente na Praia de Naufragados, em Florianópolis.  

A retirada dos invasores havia sido determinada em 11 ações civis públicas ajuizadas pelo MPSC em 2004 – todas com sentença pela demolição e retirada dos entulhos, sendo que nove delas com trânsito em julgado, ou seja, decisões definitivas das quais não cabe recurso.   

No curso do cumprimento dessas sentenças, o Município de Florianópolis elaborou e teve atendido Pedido de Suspensão de Liminar e de Sentença com fundamento na Lei 8437/92 para obter o sobrestamento de todos os atos de intervenção nas construções irregulares existentes na localidade.   

Contra essa decisão , o MPSC, por meio de sua Coordenadoria de Recursos Cíveis (CRCível), ingressou com um recurso, julgado procedente pelo voto favorável de 18 Desembargadores, com três divergências, na sessão do Órgão Especial realizada nesta quarta-feira (15/5).

Não existe comunidade tradicional em Naufragados

No recurso, o Ministério Público esclareceu que na localidade de Naufragados não existe uma ocupação coletiva, como também não há uma comunidade tradicional ali instalada. Tal afirmativa é corroborada por relatório elaborado pela FATMA, ainda em 1984 e, mais recentemente, em Análise de Solicitação de REURB, emitido pelo IPUF no ano de 2020.

Lembra, ainda, que o Supremo Tribunal Federal (STF), inclusive, em decisão do Ministro Alexandre de Moraes relativa à área, expressamente destacou que o “fundo de cena da controvérsia não envolve a proteção de povos tradicionais, mas utiliza-se de pretexto para o não cumprimento de sentença.”

Também destaca, que a área ilegalmente ocupada além de fazer parte do então Parque Estadual da Serra do Tabuleiro trata-se de área de preservação permanente de restinga, conforme art. 4º, inc. VI, do Código Florestal. Portanto, não é passível qualquer tipo de regularização ou mesmo de alteração das características de sua ocupação.

Trânsito em julgado

De acordo com o Ministério Público, todas as questões referentes aos processos já foram amplamente analisadas e debatidas tanto pelo Juízo de primeiro grau como pelas Câmaras de Direito Público do Tribunal de Justiça, em ações já transitadas em julgado e nos cumprimentos de sentença respectivos, sendo necessário assegurar sua autoridade.

A maioria dos processos suspensos por força da medida liminar possuem decisão definitiva de mérito, ou seja, quase a sua totalidade já está albergada pelo manto da coisa julgada. Não se permite a alteração ou sua revisão, tornaram-se, pois, imutáveis.

Inclusive, sustenta, o Ministério Público, que a Lei 8437/92, invocada pelo Município na concessão da medida liminar, veda expressamente sua aplicação aos processos já transitados em julgado.

“Nesse plano, salta aos olhos o descabimento da pretensão conciliatória almejada pelo ente local, haja vista o avançado estado do processo, desde que todas as decisões que o Município de Florianópolis pretende suspender são sentenças definitivas de mérito – já transitadas em julgado – contra as quais não cabe sequer o manejo de Pedido de Suspensão de Liminar”, destaca a CRCível no recurso.

Com a cassação da medida suspensiva, as ordens judiciais para desocupar e demolir as construções edificadas de forma irregular, além da remoção dos entulhos e materiais porventura existentes nos imóveis questionados deverão ser cumpridas.

Existe comunidade tradicional em Naufragados? 

Não. Quando foi criado o Parque Estadual da Serra do Tabuleiro, do qual significativas porções da região de Naufragados ainda fazem parte, não havia qualquer residência na área – apenas três a cinco ranchos de madeira de ocupação temporária, como atestado pelo Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis (IPUF) na época.  

A ocupação da área se iniciou de forma clandestina nos anos 1980. Somente em 1984 foram identificadas poucas construções em Naufragados – todas ilegais e fruto de invasão de área de preservação permanente. Eram de 12 a 15 casas, sendo somente quatro de moradia fixa, conforme relatório da Fundação do Meio Ambiente (FATMA). 

A atividade pesqueira desenvolvida em Naufragados nunca utilizou residências permanentes, mas apenas instalações temporárias para o período da pesca. 

Por que os imóveis são ilegais? 

As casas foram construídas de forma clandestina, sem qualquer autorização do poder público (licença ambiental, alvará de construção etc.), em área de preservação permanente (APP) de restinga, local onde não é permitida a realização de edificações, tanto pela legislação federal (Código Florestal), quanto pelo atual Plano Diretor de Florianópolis.  

Inicialmente, a Praia de Naufragados fazia parte da área do Parque Estadual da Serra do Tabuleiro. Em 2009, por meio de uma alteração da legislação estadual, o local foi transformado na unidade de conservação estadual denominada “Área de Proteção Ambiental do Entorno Costeiro”, mas isso não alterou a situação de ilegalidade das construções, pois as restrições estão mantidas tanto pela legislação federal como pela legislação municipal. 

Os ocupantes atuais não ajudam a preservar a área? 

De forma alguma. A simples inspeção visual já permite verificar que a construção de casas ilegais demandou o desmatamento de áreas de preservação permanente significativas, causando danos à flora e fauna locais. Além disso, não há qualquer sistema de esgotamento sanitário para a destinação dos efluentes de eventuais ocupantes dos imóveis, tampouco serviço de coleta de lixo. 

Não é à toa que um parecer do Instituto de planejamento Urbano de Florianópolis (IPUF) de 2015 conclui que a ocupação da área compromete a preservação do meio ambiente, devendo-se restringir seu uso aos pescadores artesanais (com utilização controlada de estruturas de apoio temporárias e restritas ao período de pesca) e banhistas e usuários com intuito de lazer. 

Existe alternativa para a demolição dos imóveis ilegais em Naufragados? 

Não. Todas as edificações estão situadas em uma área de preservação permanente de restinga, protegida pelo Código Florestal brasileiro, por ser um ecossistema muito frágil e extremamente relevante para a preservação da fauna e da flora locais, onde não são admitidas edificações. Dessa forma, a própria legislação não permite a regularização fundiária dos imóveis clandestinos da área. 

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Por que o MPSC pode agir em Naufragados, mas não atua em casos como o dos beach clubs em Jurerê, por exemplo? 

Os beach clubs de Jurerê estão na faixa de marinha, ou seja, distantes menos de 33 metros da areia da praia, portanto pertencem ao domínio da União (art. 20, inciso VII, da Constituição Federal). Assim, somente o Ministério Público Federal tem atribuição de atuação nesse caso.     

Já Naufragados é uma região classificada como área de preservação permanente (APP) pela legislação federal e pela legislação municipal e é parte de duas unidades estaduais de conservação da natureza: o Parque Estadual da Serra do Tabuleiro e a Área de Proteção Ambiental do Entorno Costeiro (que abrange parte de Naufragados). Nesse caso, a atribuição é do Ministério Público estadual.  

Vale ressaltar que Jurerê é uma zona urbana consolidada, ou seja, um bairro densamente habitado, integrante do perímetro urbano da cidade. Já Naufragados não está no perímetro urbano do município de Florianópolis e é desprovido de qualquer tipo de serviço público (coleta de lixo, energia elétrica, estradas, rede de água e esgoto, transporte público). Todos aqueles que edificaram em Naufragados o fizeram de forma clandestina e invadiram os terrenos que ocupam. Nenhuma licença ou ato de autoridade administrativa legitima as ocupações lá existentes. Tudo é clandestino e nenhum centavo de tributo é recolhido. 

Fonte: Coordenadoria de Comunicação Social do MPSC